"Quando nos lembramos de pessoas que foram gentis conosco, quando nos lembramos de tempos felizes, não estamos meramente nos envolvendo em uma fantasia. Estamos relembrando a nós mesmos de nosso lugar no mundo. A nostalgia nos dá apreciação renovada pelas pessoas e lugares que constituem nossas vidas." – The Time Machine: How Nostalgia Prepares Us For the Future em Hidden Brain por Shankar Vedantam
Trecho de
entrevista concedida a Jorge Luís Barros em 2011:
Jorge: Há uma chamada Quem? E ela
parece destoar totalmente do resto do disco, foi intencional? Thales: Esta música
quase não entrou, ela assemelha-se mais a uma sobra, imagino eu. Porém, me veio
quando eu estava navegando pelo Orkut de Estela e reparei que não havia foto no
perfil. Pensei em alguém descontente com o próprio eu, sem se reconhecer no
espelho e escrevi com base nisso. Não houve outra estrofe por eu não ter
conseguido pensar em nada depois da ‘pálida sombra do que não fui...’
definitivamente é uma canção ruim, mas tinha relação com o que eu estava
fazendo, então a aceitei para ser a penúltima música do lado A.
Quem? (2011)
Letra e Música: Thales Salgado
Cântico de silêncios
Em difusa forma, quase um borrão
Na simetria do espaço
Pálida sombra do que não fui
Com que direito censura?
Os traços e os planos que faço
Quem me olha lá?
Quem me vê chegar?
Não me reconheço no espelho
Ouvi em uma das primeiras aulas
do curso de Lucas Silveira que “as boas ideias sobrevivem a problemas técnicos”.
Tendo isso em mente, mantive o áudio de quando tinha 21. Para ser sincero, eu
já fiz isso uma série de vezes nas postagens do blogue sem ter ciência dessa
máxima. O trecho da entrevista sobre o Mosaico de Estrelas veio como tentativa
de contrapor isso. Em 2011 minha visão era taxativa “definitivamente é uma
canção ruim”, o pensamento aos 30 é o mesmo? Será que com alguns retoques isso
mudaria? Quem sabe novos versos ou uma regravação, em um estúdio, daria outro ar,
mesmo a essa composição? Elucubrações.
Independente disso, me lembro que
essas composições foram realizadas em julho e agosto de 2011. Estes dois meses
compreenderam sessenta e dois dias dos quais me lembro de poucos acontecimentos,
além das canções, poderia olhar em meu moleskine outros eventos que tenham
ocorrido, mas, o que mais estava acontecendo? Qual era a vida?
O isolamento em que estou já
conta e setenta e quatro dias. Nele, não surgiu outro álbum (embora Adriana
Calcanhotto compôs seu disco ‘Só’ inspirada no período, cada um encara a fase à
sua maneira) mas apenas uma música e uma série de desenhos. Os tempos são
outros:
Em entrevista à Folha de São
Paulo, o profº de neurociência da Universidade Federal do ABC, André Cravo, explicou
que um dos fenômenos que interferem na nossa sensação da passagem do tempo são
quantas ocasiões marcantes e diferentes entre si aconteceram em um determinado
intervalo e que, a partir de milhares de relatos sobre a percepção do tempo
durante a pandemia, é possível identificar que as pessoas estão sentindo o tempo
de forma diferente: “Temos visto relatos de quase tudo: semanas que passam
voando, outras que se arrastam. Mas, de maneira anedótica, todo mundo concorda
que o tempo está diferente”.
A maior diferença entre o antes e
o agora? Não poder sair, andar pela cidade à fora imaginando a tela em que
retrato a saudade que vesti como luva.
Além da letra e um verso que foi omitido da letra, um poema intertextual escrito no ano seguinte |