“Qualquer um que queira escrever algo decente precisa viver dentro de si. Quem falou isso foi poeta austríaco Rainer Maria Rilke, não eu. De qualquer forma, vou evitar ficar citando Rilke. Tem gente que cita autor inteligente para parecer mais inteligente, e eu acho isso péssimo. Quando alguém começa a falar de grandes autores eu começo a pensar em como eles são grandes e em como a pessoa que está citando parece pequena, minúscula, ao lado de gênios.”
Os trechos no Moleskine de 2011 |
Ele me chamou atenção pois, desde o início, o blog contou com citações. O motivo eu já não sei. Talvez fosse referenciar autores que eu goste. O primeiro texto tem uma citação de Milan Kundera. Com o passar do tempo, a citação tornou-se uma obrigação, e, por vezes, me pego na Wikiquote procurando por alguma que tenha relação temática. Outras, como as recentes menções a Jeff Tweedy surgiram durante a leitura de seu livro sobre composição. Era coerente. Este trecho de Natália ressoou comigo, particularmente, por ser o que motivou essa letra.
Ela era a quarta em um conjunto de dezesseis composições que eu tentava completar em 2011. A única finalizada naquele ano, nem consta neste registro, foi a décima sexta: Referência, feita com versos da poeta do passeio azul: Kariny Camargo. Outras seguiram com o passar dos anos, mas creio que não chegam, até o momento, a dez. A ideia de falar em “heróis” partiu do refrão de Ideologia, de Frejat e Cazuza. Quem seriam meus heróis? E heroínas? Várias dessas pessoas ainda estão vivas! Em 2018, Frejat comentou com a Rolling Stone a razão de ter evitado cantá-la por anos:
“Eu não tenho heróis, não tenho relação de idolatria com ninguém. Mesmo as pessoas que eu mais admiro – seja na área humana, na história da civilização, ou na música, os guitarristas que adoro –, não tenho relação de idolatria com nenhum deles. O Cazuza, sim, ele tinha essa relação de idolatria, então ele se sentia muito à vontade de cantar”.
A ideia de utilizar os incêndios partiu de duas partes, tanto a Sra. Ezzzausta que havia me passado o livro Pequenos Incêndios por Toda a Parte de Celeste Ng quanto pela própria responsável pela arte que ilustra o post, Isabella Proença. Que publicara um trabalho em aquarela em que uma casa tomada por chamas surge em frente à uma grande figura. Esse foi, inclusive, um dos pontos que mencionei quando conversávamos possibilidades para a nova ilustração, em que ela empregou aquarela e giz pastel.
Letra e música: Thales Salgado
Alguns de meus heróis se devoravam
Outros tomavam chimarrão
Alguns falavam sobre o tempo
Ou anteviam a revolução
Minhas heroínas, também,
Nunca deixaram calar
O sangue-quente, a cintilância,
De um infinito particular
Não são beatas, inamovíveis,
Mesmo assim, se erguem
Como seremos vistos amanhã
Se tudo o que fizermos
For sobreviver e fugir?
O que faremos quando
Até o espelho nos contra-atacar?
Quantos incêndios devem se alastrar
Por toda a nossa alma
Para ela poder descansar?