“Porque alguém escreve é uma questão que posso responder facilmente, tendo perguntado a mim frequentemente. Acredito que alguém escreve por necessidade de criar um mundo em que possa viver. Eu não podia viver em nenhum dos mundos oferecidos a mim – o mundo de meus pais, o mundo da guerra, o mundo da política. Eu tive que criar um mundo meu, como um clima, um país, uma atmosfera em que eu pudesse respirar, reinar e recrear a mim quando destruída pela vida. Essa, acredito eu, é a razão para todo trabalho artístico.” – Anaïs Nin, fevereiro de 1954 em O Diário de Anaïs Nin vol. 5 (1947-1955), como citado em Mulher como Escritora (1978) por Jeannette L. Webber e Joan Grumman, p.38
Quando decidi que escreveria sobre essa música, contava ainda o 31º em quarentena (hoje é o 105º à título de comparação) queria me utilizar de uma composição melódica solar e esperançosa, algo que ocorre pouco em meu universo enquanto “compositor solo”, escolhi, então, uma melodia que não me pertence. É um dos lados agregadores das parcerias, você se deparar com caminhos que pertencem ao universo particular do outro e sua bagagem e forma de perceber o mundo.
Retrabalhei, então, trechos da letra para retratar, então, essa ideia de
reencontro após a distância, em que um eu-lírico sente que a sensação de
completude virá ao poder reencontrar outra pessoa. Passei, inclusive, a pensar
como há versos ou frases que ficam no imaginário, como “um coração a palpitar”
que também reside em Falta, escrita por Anderson Bezerra.
No “refrão” há brincadeira orbitando “as respostas certas para as
perguntas erradas/as perguntas certas e só respostas erradas” como fosse um
círculo perfeito de imperfeições, coincidência ou não, minha letra de Baseado em Fatos, também escrita em 2009, possui um trecho em que os versos brincavam “E
as diferentes formas de sermos iguais/São iguais maneiras de termos
diferenciais”. Qual era a influência de versos assim? Fernando Anitelli? Capital
Inicial? É difícil traçar e, no fim das contas, isso não importa.
Na análise da psicóloga Erika Mendes, o refrão não seria repetido tanto,
a menos que a intenção fosse deixar gravado na cabeça, o que ocorreu com ela,
mesmo assim, ela sentiu o resultado como o tipo de música que se ouviria cantando
enquanto preparava o jantar.
Mais
Nada (2009/2020)
Letra:
Bob Barduchi Oliveira e Thales Salgado
Música:
Bob Barduchi Oliveira
Só
que isso não é mais um jogo de azar
A dose
errada de amor vai me matar
Entenda,
me dê sua dose certa
Posso
ir mais devagar se precisar
Mas,
na hora, devagar não vai chegar
Vou
dar um tempo, uma pausa para cantar
Esquecer
da vida, abrir os braços e voar
Estar
nas alturas sem o ar para respirar
As
respostas certas para as perguntas erradas
As
perguntas certas e só respostas erradas
Qual
é o lado verdadeiro, da verdade?
Basta
viver para rimar
Se
tenho voz para cantar
Talvez
alguém por quem lutar
Um
coração a palpitar
Minha
alma vai saltar
Se
eu puder me declarar
Quando
a gente se encontrar
Sei
que não vai me faltar
Mais
nada.
Refletindo um pouco mais sobre o período de criação, encontrei um faixa a faixa escrito
em janeiro de 2010 em que eu comentava que “Bob decidiu que eu deveria
cantar e ajuda-lo a montar, para relembrar os velhos tempos das primeiras
composições”.
Considerando que o marco zero de nossas composições ocorreu em 2007, me
admira que eu já estivesse falando em “velhos tempos”. Assumirei, com isso, que
o exagero era uma característica bem mais aparente em mim naquela época do que
é agora.
Tentando delimitar melhor as datas, encontrei um e-mail de 23/07/2009 em
que compartilhava uma gravação preliminar da música, então, ela não deve ter
ficado pronta muito antes. A gravação original fora realizada no quarto da casa
em que ele morava à época, lugar em que, podemos referir carinhosamente como “Rua
do Baixo”. Não faz muito tempo, comentávamos sobre esse lugar no tempo-espaço
em que éramos vizinhos.
Milan Kundera escreveu em A Ignorância que “Em grego, retorno se diz nóstos.
Álgos significa sofrimento. A nostalgia é, portanto, o sofrimento causado
pelo desejo irrealizado de retornar.”
Há alguma nostalgia, então, se pensamos em
lugares nos quais não podemos estar novamente. Não podemos visitar e apontar um
dos lados para o novo dono e dizer “ali Tributo aos Sentimentos tomou forma” e
receber de retorno um olhar confuso ou um “Ah! Entendi” de alguém que não faz
ideia do que ela vem a ser.
Enfim, aí está, a história viva.
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