quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Vita Brevis

"Deve ter sido por esse tempo que começaste a procurar uma verdade que pudesse salvar a tua alma de tudo o que perece." Jostein Gaarder, Vita Brevis
   
 

       Quando leu Vita Brevis no final de 2013, coincidentemente, um período repleto de composições, a busca contínua de propósito. Mal sabia que o período que se seguiria seria apenas de silêncios. Vez ou outra nascia uma vinheta, pouco elaborada e que, por si só, não apontava caminho nenhum. Talvez a frase atribuída a Borges fosse seu cais muitas coisas tenho lido, poucas vivido. Nesse sentido, a inexistência de composições em três anos pudesse apresentar um vislumbre de salvação: a obsessão cessara no momento em que mais viveu? Ninguém, nem ele mesmo possuía essa resposta.
         O dia em que os primeiros versos surgiram foram após perder o aparelho celular. Se perguntou a razão de não ter feito o backup das fotografias, notas e conversas. Sim, anos antes ele cantara "fotografias são mentiras", mas algumas vezes, por mais não fosse afeito, valiam a pena pelo registro. Poderiam conservar ao menos o momento do clique. Sem a memória do cartão nada disso seria possível, talvez, essa impossibilidade tenha motivado o inconsciente a desenhar uma ponte diferente para ternas memórias de viagem. Também não fazia muito tempo o livro de Umberto Eco ressurgira em seu cotidiano, usar "memória animal" provavelmente tenha partido de alguma reflexão d'A memória Vegetal.
        No mês seguinte se deparou com um texto da Superinteressante falando de como havia uma rede de lembranças compartilhadas, trocamos memórias entre amigos como um quebra-cabeças. Sabia que usar termos como "guardiões" podiam soar tolo ou didático, não seria a primeira vez. Mas coube na melodia que tinha na cabeça, então, qual seria a vantagem de fugir dessas escolhas? Foi apenas no mês de dezembro que conseguiu concluir o óbvio: ele era apenas uma máquina de recordações tentando escapar, em vão, da Indesejada das gentes.



Vita Brevis (2016)

A nossa foto não revelada
Esmaecida, quase um borrão
Nossa memória animal é falha
Mas recorrendo à tradição

Vou escrever ou desenhar
Faço o que for para guardar
Tudo dessa nossa vita brevis

Nessa existência compartilhada
Nossos amigos são guardiões
Somente o tempo da mente é nosso
A nossa vida é invenção

Vão se as tardes
Vem manhãs
Mal se nota
Temos cãs
É só a morte
A se descortinar



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