sexta-feira, 5 de maio de 2017

Se ela não Amanhecer

E em algum lugar de 2013:


Não restará na noite uma estrela.

Não restará a noite. 

Morrerei, e comigo a soma 
Do intolerável universo. 
Apagarei as pirâmides, as medalhas 
Os continentes e os rostos. 
Apagarei a acumulação do passado. 
Transformarei em pó a história, em pó o pó. 
Estou mirando o último pássaro. 
Deixo o nada a ninguém.

O Suicida - Jorge Luís Borges


"Sweet desires and soft thoughts return to me..."

K - Bom dia. É assustador ver um e-mail que fale do seu ontem e me traga um "suicídio". O meu hoje não poderia fazer nada a respeito. Já pensou nessa situação? Se amanhã eu simplesmente morresse?
T - Em resumo? Pra ser sincero eu já pensei nisso, não me lembro em que situação.
Nós conversávamos e você não estava muito contente. E através de palavras e silêncios nunca podemos quantificar como a pessoa está, de fato... É inquantificável, pois, você seria a primeira pessoa com quem me importo a morrer em minha vida. O estranho é que através da tecnologia somos amigos próximos. Por nossa distância na realidade eu me pergunto quanto tempo levaria para que a notícia chegasse a mim, depois de uma semana? Quando eu decidisse ligar para seu celular?! Em posts de suas amigas e amigos de longa data, que tornariam sua página do facebook um mausoléu? Seu face estaria presente? você não gosta de rastros poderia fechar a conta. Se você morresse de suicídio 
Provavelmente apagaria o máximo de informações para que sumisse com todas elas. 
Penso em O Dia Nunca Igual e na frase ambígua: "Atira-se ao Rio". Quando ouvida o Rio é apenas rio. Se o fizesse estaria com seu celular, o que impediria que a ligação chegasse. 
Sem cartas, sem notas, não um pedido de socorro. Não uma forma de chamar a atenção... 
Se você simplesmente morresse, sem intenção, seria uma fatalidade. Minhas palavras nadam no abstrato buscando uma objetividade que não virá. Se você morresse amanhã eu sentiria sua falta de uma forma que desconheço. Sempre que você desaparece eu sei que tem uma razão, eu sei onde você 'está'. Se você morresse não mais estaria. 
Estaria em mim e em nossas conversas longas e curtas por e-mails whatsapp, msn, Facebook. Em nossas conversas pessoalmente. Em suas partidas apressada da sala. 
Nos poucos momentos em que a vi usar seus óculos, na única vez que encostei em seus cabelos. Se você morresse amanhã eu sentiria sua falta, não pela parte minha que morreria em você. Mas por quem você é e seus pontos de vista únicos, por seu amor pela França 
Pelas poucas palavras em francês que a ouvi pronunciar... 
Ao mesmo tempo eu não estaria revoltado com você. Sei de sua decepção com a humanidade, suas dúvidas de como nos tornamos lixo. De como tudo é um amontoado de ações sem sentido sem a existência de liberdade. De como você também tem frustrações quanto ao que sente vontade de fazer.

E a forma como você escolheu prosseguir por sentir que crises causam mais mal do que a vida por si só. Por um lado, haveria o significado. Como em Alvares de Azevedo "A dor no peito emudecera ao menos". E saber que a dor havia passado, que sua angústia havia findado. Isso não compensaria, mas seria o sentimento de "eu a entendo, pelo tempo que podia ela prosseguiu até que a situação não mais admitisse meias-medidas e materializasse a coragem para uma medida definitiva". Outra palavra estaria comigo também: "quase". Eu teria a impressão de quê poderíamos fazer muitas coisas juntos.
E quase fizemos.
K - Gostei tanto da sua “definição” da minha morte que deu vontade de torná-la real só para fazer suas palavras terem “sentido” (?) rs
T - O cérebro funciona de uma maneira estranha, não? escrever aquele e-mail minou minha animação, acho que mergulhei tanto na busca da definição que uma parte minha interpretou como realidade.
K - Calm down...I’m alive! : )



Se ela não Amanhecer (2013)

Se ela não amanhecer
Quanto de mim vai com ela?
Quando eu olhar da janela
Por que estará lá o sol?

Quanto será quase?
Quanto será se?
Haveriam rastros pra seguir?
Com a humanidade
Uma decepção
"Nunca mais meias medidas"

Se ela não amanhecer
Quantos daqui vão julgá-la?
Quando o que ela buscava
Era estar livre e só

Quanto será fase?
Quanto sabe-se:
Pela minha vida vai seguir?
Com a poesia
A sublimação:
Achou a paz que queria

"De onde vem a canção?"

2 comentários:

  1. Engracado o tema... esses dias mesmo mencionei "Hao de chorar o cinamomos". Adorei o fato de ter usado sua resposta do email. Ja era por si so um texto seu esperando para ser publicado para outros tambem. Gosto tambem de ver as ideias que vinham de mim, e pensar que agora acho que achei a solucao para o amontoado de ações sem sentido sem a existência de liberdade. Acho que de alguma forma, em algum lugar, em certo nivel, a gente pode se esconder e ser livre sem a necessidade da medida final. Acho agora eu conseguiria 'nao-viver' menos com o "quase" do que com a medida final...

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    1. Olá, Unknown, há uma circularidade temática. Você falou dos cinamomos. Interessante haver "lírios", flores presentes no álbum de 2013. Editando o texto do e-mail fugi de lugares-comuns como falar da inspiração da melodia em "Tão perto, Tão Longe" do Lobão. Ou como "nunca mais meias medidas" foi tirado do discurso de Mike em Breaking Bad. Ismália e Se eu Morresse Amanhã poderiam figurar, quem sabe no futuro? Gostaria de ouvir/ler mais acerca dessa solução. "A verdade é que eu não tenho escolha é por isso mesmo que eu sou livre, não sou eu o mentiroso: foi Sartre quem escreveu o livro".

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