domingo, 23 de julho de 2017

A história até agora.

Título das canções desde 2007 até julho de 2017 (clique para ampliar)
"Comecei, então, a escrever só para mim mesmo, sem ânimo de publicar (tal como estou fazendo agora) e sabendo perfeitamente que a literatura, como o nascimento para a vida, continha em si mesma sua própria essência, que não era outra senão o desaparecimento. No entanto, mais tarde, publiquei um livro, e isso arruinou o enfoque radical de meus começos. Eu havia me iniciado no mundo das letras considerando que escrever era um desapossar-se sem fim, um morrer sem detenção possível. Publicar complicou tudo. Me converteu pouco a pouco num escritor relativamente conhecido em meu país e isso me pôs em contato com o horror da glória literária. “Se uma pessoa busca o sucesso, só tem dois caminhos, ou o consegue ou não o consegue, e ambos são igualmente ignominiosos”, disse Imre Kértesz”. Doutor Pasavento, Enrique Vila-Matas
         Em 1997 fui instruído a escrever uma redação de tema-livre. Meu título foi "Vamos formar uma banda?". Naquele momento, eu não imaginava que viria a tocar algum instrumento. Havia sim, o interesse em conhecer mais acerca desse universo. Recordo ter escrito cartas ao programa Porta da Esperança, expressando o que era apenas um desejo. Papai Noel não sei se recebeu alguma carta, quando foi que deixei de acreditar? Pudera ter o coração do verdadeiro crente! Um Memphis foi aparecer em minhas mãos em 2002 e só foi, realmente ser tocado em 2004. Era o primeiro violão com distorção, resultado da soma de quedas e pregos no tampo. Coisas que a cola de madeira não era capaz de unir novamente. Não consigo lembrar o que eu dizia na redação, mas, tudo parecia simples. Um amigo chama o outro, quando menos se espera estão lançando fitas k7, LPs, CDs. Outros tempos. Lembro disso: uma inocência relativa a como tudo era feito. Não acho que o Eu daquele tempo tenha pensado em como eram as composições, nem nada disso.
        Em 2007 encontrei um encadernado de textos da 1ª série do Ensino Fundamental. Quando li essa redação tive ganas de pensar em destino. Estava eu no 3º ano do Ensino Médio e fazendo parte de uma banda. Não mais aquela imaginária, mas 
a banda Falsa Modéstia. Essa banda dá nome ao blog. Arranquei a redação do espiral na intenção de plastificá-la ou algo assim. O plano falhou e acabei perdendo esse "documento". Ano passado conversando com colegas daquele período quis saber se alguém ainda tinha nas gavetas as tais redações. Sem sucesso. Enquanto a banda estava ativa, a composição tornou-se um hábito com requintes de vício. Não era possível consolidar um repertório mutante. Cada ano avançava pensando "as canções de agora são melhores que as de antes, é melhor deixar de lado o que já foi feito". Como fazê-lo? Deve haver um artista por aí que não repita o repertório a cada show. Parece um ato anticomercial, mas, nem sempre a música é comercial.
           Em 2017, depois de alguns anos de escritas esparsas, passei a reunir composições sob o título "Nada há de novo sob o sol", afinal, sempre haverão composições. Uns anos mais, outros menos - alguns, nenhuma, estou ciente disso, ainda que nem sempre aceite. Até aí "nada há de novo". A ideia de retirar esse trecho do Eclesiastes é simplesmente abalizar essa busca. Esse eterno retorno à intenção de criar. Como a procura da batida perfeita de Marcelo D2. O blog, além de composições minhas e de amigos e amigas próximas. Passou a englobar também pensamentos relativos à outras formas de arte com a qual entro em contato. Notadamente, espetáculos musicais e teatrais. Esporadicamente reflexões realizadas após alguma exposição. Não necessariamente consigo escrever acerca de tudo o que vejo. Por exemplo, Poesia sem Fim de Alejandro Jodorowsky foi o filme mais poético que assisti esse ano, como traduzir essas imagens em palavras? Espero algum dia saber. Ter o arcabouço teórico para tanto.
          Enquanto isso, sigo refletindo as canções. Sabe quando você pensa "essa música foi feita para mim?" Parte do ato de criar vem dessa vontade de se partir e se repartir. Poder, realmente vislumbrar de onde vem as canções, o que elas dizem, mesmo. Quando não as de outrem, as minhas. Essas, ao menos, posso falar com alguma propriedade. Ou é só Falsa Modéstia?
         

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Passeio Azul

"Às vezes, você perde vários poemas, porque sente uma frase, sente algo murmurando no seu espírito e não presta atenção porque está ocupado com os ruídos da vida. É necessário apurar o seu ouvido, ter a humildade de anotar a coisa mesmo quando ela não é muito boa. Pode, de repente, de um texto meio nebuloso, meio esquisito, meio simplório demais, dar raiz a um poema posteriormente interessante." - frase creditada a Affonso Romano de Sant'Anna (carece de fontes)
              

Passeio Azul (2013)

Num passeio azul
Encontrei as flores
Que inspiraram versos
E eu não escrevi.

Achei meio banal
E cheio de cores,
O meu mundo é bem mais gris.

Se desanimado
Nem a alma me resta,
Só quero uma dor
Pra chamar de minha.

Onde começa a poesia?
No começo ou no fim?
Onde muitos leem alegria
Principia-se a pena para mim
E quando o que me tem é a lembrança
É que vou me embora

Sorrindo, indo, indo, indo...

Wanaka, Nova Zelândia



         Quantas coisas acontecem num mesmo dia? Entra ano e sai ano me vejo as voltas com esse questionamento. Quase como quisesse estabelecer uma relação de causa e efeito, realizei anos atrás uma canção que era uma datação em Carbono-14. Quem sabe um dia ela apareça neste blog. "Passeio Azul" foi apenasmente montada por mim. Kariny, por duas vezes, se utilizou de sua veia poética e o resultado me chamou a atenção. É sempre bom poder olhar de fora os processos.
         Algumas vezes, não ter a preocupação com a letra permite foco maior na estrutura da melodia. Como nesse caso, a base provável pode ter partido do estudo dos riffs de Dave Matthews, passando por acordes de Lenine e encerrando num não-sei-quê-de Every me and Every You da Placebo. Ou sou capaz de enxergar isso apenas agora?! Seja como for, a tônica está aí. Nunca fui assíduo leitor de poemas então ter uma letra de uma fã confessa passou a pavimentar o caminho do que foram as canções de 2013. É uma das faixas que tenho a curiosidade em desenvolver um arranjo e uma gravação decentes um dia. Enquanto esse dia não vem tomo emprestado Glauber Rocha, e sigo com uma câmera na mão e uma ideia na cabeça. A qualidade do vídeo é intencional!


Fragmentos das conversas em que a letra surgiu.


As tablaturas como forma de recordar possibilidades musicais.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

How many restarts left?

Fourteen years later


"And then one day you find ten years have got behind you. No one told you when to run, you missed the starting gun"

Time, Pink Floyd


How Many Restarts Left (2010)

The darkness come across
And my light is going out
What more can I lost?
When my mind is filled with doubt

If I never try I'll never know
But I'm trying and change
Shouldn't be that slow

How many restarts left?
I don't want to spend
My life as a test
How many restarts left?
I don't want to spend
My own life as a guest

I will wait for the snow
Hoping that it will make all more easy
I will wait for the snow
And you can wait with me
Would you please me?
How many restarts left?

Second entry on my first moleskine (2010)

         And although 2011's To Fanny was the first lyric I'd posted on the blog, How many restarts left? Was made a year or so before. What can I say? Sometimes there are structures that resonates for a long time as “If you never try you'll never know” from Coldplay's Speed of Sound and Fix You. That's the kind of thing one would lose in translation. In Portuguese, it could go down to 'se não tentar não saberás' and at the same time it would not be an obvious homage to Chris Martin as I wanted.
          A friend of mine had the phrase quantos recomeços mais in her msn messenger and it made me think about a lot life. That sensation of life just passing by. As you're not yourself, you know? I find it kind of sad to be experiencing it. You feel sad and it makes you creative! What is possible to do with the result? Sometimes a drawing sometimes a song.
          As most of my recordings it is only an acoustic guitar and my voice but in this case I'd tried to use a mellotron vst plugin inspired by some Chili Peppers's songs as Sir Psycho Sexy and Tearjerker trying to build an atmosphere. These arrangements were crafted two years after I've wrote the song - hence why the file dates 2012.  If I can recall it was never been played live and I don't really know if it was ever a thing. Sometimes I feel the need to encapsulate feelings and that's it. Maybe someday I'll be able to overcome a shyness that is criminally vulgar...


sábado, 1 de julho de 2017

Enquanto as Crianças Dormem - Teatro Aliança Francesa


"O esforço de ser empregado inclui não só a incerteza quanto a duração do emprego, mas também a humilhação de se submeter a muitas práticas e dinâmicas de trabalho. Como a maioria das empresas tem a formação de pirâmide , em que uma base ampla de empregados abre caminho a uma ponta estreita de gerentes, a questão de quem será recompensado - e quem ficará para trás - em geral, torna-se uma das mais opressivas do local de trabalho e, como todas as formas de angústia, alimenta a incerteza." Desejo de Status, Alain de Botton


         Chegando ao trabalho Raul fazia questão de colocar seus fones de ouvido. Ainda se afirmasse contrário à toda sorte de rituais, lá estava ele. A trilha sonora tem a função de desviá-lo de um cotidiano medíocre e repetitivo. Sente vibrando em si das trilhas de Zimmer às baladas de Zimmerman e cada faixa vencida carregava cada um de seus atos com um peso invisível aos colegas que o cercavam. Dessa maneira, era natural que ele se identificasse com aquela moça avistada quase sem querer no fundo da lanchonete. A lanchonete mais imunda da cidade, é verdade. Mas, sendo os clientes velocistas contumazes, quem notaria sabores espúrios no cardápio? Raul, por exemplo, não se importava. Desde pequeno acostumara-se a ouvir falar de hambúrgueres feitos com minhoca. "Desde que seja saboroso! Por mim poderiam ser como as tortas da Sra. Lovett em Sweeney Todd". A moça cantava a existência de algum lugar em que os sonhos podiam mesmo se tornar realidade. Nessa hora ele a viu como aquelas pessoas que imaginavam a vida como um musical dos anos trinta. Salvo melhor juízo, o nome dela era Kelly. Raul fora atendido por ela vezes demais para deixar de reparar seu nome no crachá. Era aquela relação en passant. Provavelmente, fora do estabelecimento ele mal a reconhecesse. Mas divago.


O preço que se paga às vezes é alto demais

       Kelly (Carol Hubner) nutre o desejo de se tornar uma estrela dos musicais da Broadway. Da mesma forma que a Alice de Paris-Manhattan tinha como seu confidente um cartaz de Woody Allen, Kelly tem como seu norte inspirador Fred Silveira (Narração em off) e costuma conversar com ele quando se encontra em sua casa vazia. Casa que permanecerá vazia mesmo quando seu colega de trabalho Tom (Haroldo Miklos) a visita. A relação dos dois não é clara, ou talvez o seja: a pura falta de opção. É fácil se ver torcendo pela protagonista, para que ela saia da lanchonete e alcance um ponto mais alto do que o que lhe é oferecido por seu gerente (Juan Manuel Tellategui) e o funcionário puxa-saco Nick (Diogo Pasquim). Uma visita ao supermercado pode obter a surrealidade de um filme de Michel Gondry turbinado com anfetaminas, é a espetacularização magnética do consumo. Zeca Baleiro já advertira: lugar de ser feliz não é supermercado. Diria Gessinger: satisfação garantida! A benfeitora Ellen (Carolina Stofella) surge em meio a um turbilhão de tristezas como uma luz no fim do túnel. Ou seria um trem na contramão?
          Dos méritos da peça estão como seus personagens são palpáveis. Nossas redes sociais gritam as mortes de porcos, a tortura de assassinos e, muitas vezes, nos encontramos passivos diante de colegas esboçando um riso sanguinário diante da maldade. Então, ao vermos uma personagem empunhar a câmera do celular diante do inevitável, vemos um reflexo de nossa própria vida. É como a ironia da capa do livro de Yaël Gabison (Benvirá, 2017) ter o nome de Seja o Herói de sua Vida e em sua capa ostentar ilustrações de Walter White, Frank Underwood, Dexter e Tywin Lannister. Quem são nossos heróis hoje em dia? Malparidos como Pablo Escobar? Estamos cínicos a esse ponto? Seja como for as horas nesse espetáculo passam e nem percebemos, há poder maior da arte que nos fazer mudar nossa perspectiva temporal e social ao mesmo tempo? 

Ficha Tecnica:

Texto e direção: Dan Rosseto
Assistente de direção: Diogo Pasquim
Elenco: Carol Hubner, Carolina Stofella, Diogo Pasquim, Haroldo Miklos, João Sá, Juan Tellategui e Samuel Carrasco
Direção de produção: Fabio Camara
Produção executiva: Roque Grecco
Trilha sonora original: Fred Silveira
Figurinos: Kleber Montanheiro
Cenário e adereços: Luiza Curvo
Desenho de luz: César Pivetti e Vania Jaconis
Preparação de elenco: Amazyles de Almeida
Direção de movimentos: Alessandra Rinaldo
Sapateados: João Sá
Operador de luz e som:Bob Lima
Fotos: Leekyung Kim
Assessoria de Imprensa: Fabio Camara
Realização: Applauzo e Lugibi Produções Artísticas


Até 27/07 - Quartas e quintas às 20h30
Duração: 110 min
Ingressos: R$ 50,00 (inteira) / R$ 25,00 (meia-entrada)
Bilheteria aberta 2h antes do início do espetáculo.
Ingressos à venda também no Ingresso Rápido.
Classificação indicativa: 14 anos


Teatro Aliança Francesa - Rua General Jardim 182 – Vila Buarque.
Capacidade: 226 lugares + 4 PNE.
Estacionamento conveniado em frente.
Informações: (11) 3572-2379