quinta-feira, 23 de abril de 2020

Recusado pelo editor: Once Upon a Time s07e01

"Os papéis se juntavam um ao outro - o sentido se contradizia, o desespero de não poder era um obstáculo a mais para realmente não poder: a história interminável que então comecei a escrever (com muita influência de O Lobo das Estepes de Hermann Hesse), que pena eu não ter conservado: rasguei, desprezando todo um esforço quase sobre-humano de aprendizagem, de autoconhecimento. E tudo era feito em tal segredo. Eu não contava a ninguém, vivia aquela dor sozinha. Uma coisa eu já adivinhava: era preciso tentar escrever sempre, não esperar um momento melhor porque este simplesmente não vinha. Escrever sempre me foi difícil, embora tivesse partido do que se chama vocação. Vocação é diferente de talento. Pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir. A Descoberta do Mundo, Clarice Lispector."
Imagem título de Once Opon a Time (s07e01), direitos reservados à ABC.

          Venho pensando em como incorporar novas referências, afinal, por pouco a frase de abertura desse texto não foi o trecho de Fado Tropical (Ruy Guerra / Chico Buarque) "É que há distância entre intenção e gesto".  A intenção principal, era participar do concurso de contos para antologia da editora Álbum de Memórias. O tema era simples: O Dia Depois de Amanhã, a Liberdade pós Corona vírus. Também não era necessário escrever muito: máximo duas páginas em arquivo Word, com texto escrito em Times New Roman, tamanho 12, espaçamento 1,5. Pensei, ruminei, digitei. Tentei absorver no texto ideias de notícias, gráficos, projeções. Por mais pudesse caminhar pelo imaginário, o prazo (15/04/2020) chegou e passou sem que eu tivesse conseguido concatenar as ideias.
        E não importa que ande com livros à mão cheia, é a prática quem permitirá a redação fluída, mesmo que não natural. Me lembrei de quando, em outubro de 2017, me coloquei a escrever uma resenha de episódio de série. Sendo um ávido consumidor de críticas, imaginei que conseguiria reunir um texto que versasse o episódio que era um soft-reboot para a série de Edward Kitsis e Adam Horowitz. Escrevi e me candidatei para a vaga de reviewer em um grande site de entretenimento. - Eu sabia que o tom de pitadas de humor contemporâneo que vinha sendo utilizado pelos colunistas anterior não seria meu forte (faltavam as referências) mas seria possível agregar outras, por Once Upon a Time ser um "filhote de Lost".  
      Não foi surpresa nenhuma que meu texto tenha sido recusado. A questão era: o que fazer com o texto que resultou da tentativa? Compartilha-lo? Claro, o fiz à confidente. Após a revisão, o editor manteve a palavra e recusou igualmente. Não mais tentei fazer o review de uma série. Ao maratonar Grey's Anatomy em 2020, passei a ver o obelisco especial de Seattle diariamente e isso me lembrou do texto que ficou no quase. A resenha para o primeiro episódio da sétima temporada de Era uma Vez um lugarzinho no meio do nada. Você leitor, se chegou ao fim destas aleatoriedades todas, poderá ler a versão sem revisão abaixo:

Once Upon a Time, 7x01 – Hyperion Heights – Thales Salgado (escrito em 08/10/2017)

"Era uma vez uma floresta mágica repleta de personagens de contos de fada. Um dia, uma poderosa maldição os prendeu numa cidade sem magia. E cada um deles esqueceu de quem realmente era. Foi assim que aconteceu..."

Os minutos finais da sexta temporada de Once Upon a Time, poderiam ter encerrado a série. Acompanhávamos Lucy, com o livro dos contos de fadas em mãos, encontrando seu pai, Henry, explicando ser sua filha e pedindo que ele a acompanhe, pois, a família corre perigo.
Ele não acredita no que está ouvindo, afinal, que herói acredita de primeira?
Nós, a audiência, ficaríamos nos perguntando para sempre qual era o grande mal que ele enfrentava e o levou a se separar de sua filha. E tudo bem! Conhecendo seu histórico familiar ele estaria à altura do desafio. Tudo acabaria como começou e especularíamos as aventuras de um Henry adulto felizes para sempre...

Como isso não aconteceu chegamos à sétima temporada da série.

Hyperion Heights é um retorno morno para OUAT. A abertura com a despedida do jovem Henry (Jared S. Gilmore) e Regina (Lana Parrilla) é simples para esclarecer o novo ambiente para a história. Henry quer sair em sua própria aventura, uma jornada para descobrir a que lugar ele pertence. Regina, mesmo relutante, aceita a decisão do filho. No diálogo ele conta para a mãe sobre a centena de livros na mansão do feiticeiro, com diversas histórias. Possibilidades Infinitas.

Alguém mais concorda que "uma branca de neve francesa e uma italiana" estão bem aquém do potencial criativo essa série pode ter? Há tantos reinos novos a explorar e a série se mantém orbitando a zona de conforto justamente quando tem a chance de dar um passo além. Mas voltemos para a história. Com a moto de August, Henry atravessa o portal aberto por um feijão mágico que o leva a um novo reino.

A trama alterna entre O Novo Reino e Seattle. Até o momento, temos Lady Tremaine (Gabrielle Anwar) como a vilã no Novo Reino e sua contraparte Victoria Belfrey atrapalhando os heróis em Seattle.
A forma como a personagem é conduzida em nosso mundo me lembrou da 'diabólica' Miranda Priestly de O Diabo Veste Prada - o close nos saltos vermelhos tem que ser proposital. Sua filha Ivy Belfrey (Adelaide Kane) demonstra insegurança perto da mãe. Sua Drizella fará um ato para provar à sua mãe que pode inspirar o medo também ou sua jornada a fará se colocar contra os ideais pregados pela mãe? Fico inclinado pela segunda opção.
Os empreendimentos de Belfrey a colocam no caminho de Roni (Lana Parilla) a dona de um bar em Hyperion Heights. Lana Parrilla reina em cena mesmo servindo bebidas. O discurso que Roni faz para Victoria ao final do episódio mostra que o duelo entre as duas mulheres poderá ser mais interessante que a briga pela guarda de Lucy, que Victoria toma parte com Jacinda.
Henry (agora interpretado por Andrew J. West) se vê envolvido no drama familiar quando sua filha Lucy (Alison Fernandez) vai atrás dele falando sobre a maldição. Ainda que negue a ideia de ter uma filha, ele parece pensar duas vezes no assunto quando conhece Jacinda (Dania Ramirez).

N'O Novo Reino acompanhamos Henry conhecendo Cinderella e tentando convencê-la a desistir da ideia de vingar a morte de seu pai. Essa versão da princesa tem temperamento forte e uma das primeiras dinâmicas dela com Henry na floresta encantada a mostram determinada e com temperamento forte. Seguindo a linha da Snow White do passado.
No baile, a dona dos sapatinhos de cristal desiste de matar o Príncipe, mas acaba acusada do ato por Lady Tremaine que se aproveita da situação.  Também ficamos sabendo que ela arrancou as asas da Fada Madrinha de Cinderella, tomou sua varinha e a vemos reduzir a pobre fada a cinzas. Espero a personagem não seja desconstruída.
A ambição dessa versão da Lady é muito maior. E sua ideia de que "magia não é poder pois pode ser tomada, já o medo é eterno" pode ser desenvolvida em mais atos malignos. Prefiro a madrasta não viva uma redenção nessa temporada. A desconstrução das personagens faz parte da série desde seu início, no entanto, uma vilã simplesmente ambiciosa e má não faz mal a ninguém.
O retorno de OUAT é competente com o que já conhecemos da história. Há personagens que mal vemos. Mas em linhas gerais os conflitos são bem apresentados. Estranhei por algum tempo o novo interprete de Henry. Porém, quando chegou a cena em que Lucy implora a que ele acredite nela eu já não pensava nisso.
Acredito que, para um reboot criativo, a série poderia ter ousado mais. Ainda estava com a Lady Tremaine da sexta temporada (Lisa Banes) em mente. Então pensar em uma reinvenção da Cinderella dentro da história me parece preguiçoso. Os criadores poderiam ter dado mais destaque à história de Tiana, por exemplo, que não tinha sido apresentada na série ou ido atrás de contos de fadas desconhecidos do público.
Claro, enquanto pensamos como produto o apelo de uma princesa clássica da Disney não tem comparação. Do ponto de vista criativo fica impressão de que a saída de parte do elenco regular os forçou a fazer mudanças e preferiram não arriscar. A magia ainda está presente, mas precisa mostrar a que veio.

Outros Pensares:
- A trama envolvendo Rogers (Colin O'Donoghue) e Weaver (Robert Carlyle) poderia ter ficado para outro episódio. Não é surpresa para ninguém que Hook e Rumplestiltskin ainda fazem parte do elenco regular da série. Teremos a famosa dinâmica "tira bom & tira mau"? Rogers pareceu bem apático, um típico idealista. Ao passo que Weaver é o tipico homem para quem os fins justificam os meios. Ele tem Tilly como informante, algo relevante por ela ser Alice.

- Em notas de produção, a atriz Rose Reynolds afirmou não ter assistido Once Upon a Time in Wonderland para não influenciar a composição de sua própria Alice. Na época da transmissão original de Wonderland a série não me cativou para ver até o final então acho a escolha da atriz acertada.

- Após Alice drogar Henry no Baile, ela o adverte a ficar longe de histórias sem relação com ele, pois coisas ruins poderiam acontecer. É justamente o que esperamos!

- Por mais óbvio que seja; só reparei que, Sabine (Mekia Cox), a companheira de quarto de Jacinda, é Tiana, na segunda vez em que assisti ao episódio. Será que ela terá uma trama própria para si em Seattle ou teremos um flashback aleatório e Tiana será mantida como amiga e confidente? Li a palavra dos produtores descrevendo a personagem e no primeiro episódio não houve espaço para mostrar.


- Sobre Lost: Seguindo com a tradição de referências Lostianas, Jacinda trabalha na rede de fast-food de Hurley, a Mr. Cluck's Chicken Sack. O número do apartamento de Henry é 815. Forçando a barra um pouco, o momento em que Lucy e Jacinda olham para o poço lembra por um breve instante Jack e Locke olhando a escotilha.


quinta-feira, 9 de abril de 2020

Beleza Parasita

"Humano, assim como a palavra "homem" deriva do grego "humus", que por sua vez significa terra. Uma das leituras possíveis do significado que possamos dar é a de "terra fértil". A nossa capacidade que nos diferencia de todos os outros seres, é que nós temos o potencial de sermos acolhimento, nutrição e suporte para que o outro se desenvolva.Por isso os gregos escolheram esse termo para tentar explicar o que é ser humano. Suporte, carinho, compartilhar ideias, deixar crescer, ajudar a evoluir...tudo isso pode ser construído dentro das relações, seja elas entre pais e filhos, casamentos, amizades, família. Você tem sido terra fértil para o outro?" Fabíola Passos, 09/10/2019




         Anos sempre passam alheios a nós. Ontem, era uma colega da sexta série de quem  eu ouvia falar. Em um estalar de dedos, passaram dezoito anos! Desses, espero tenha podido fazer ao máximo as coisas a que se propôs. Se não? Há sempre as resoluções pós-quarentena. Como lhe entregar uma cópia do vol. 2 d'O Assassinato do Comendador.
     Em uma carta para John Taylor, John Keats escreveu que se a poesia não vem naturalmente tal as folhas para uma árvore, é melhor que nem venham. Não faço ideia do que tinha em mente quando escreveu estes versos. Em dezembro eu não sabia, em abril, tampouco. Mas essa carta keatsiana, também dizia que a poesia deve surpreender por um leve excesso e não por sua singularidade. Ela deve espantar o Leitor como uma verbalização dos mais elevados pensamentos e assemelhar-se quase a uma lembrança. Sei que ele escreveu isso em 1818 mas não pude fazer outra coisa se não 'me apropriar' (viu o que tenho de fazer para sobreviver? Viver dos outros, um mero parasita) dessas palavras, pois, elas descrevem de algum modo a sensação ao ler. A melodia da canção partiu de uma tentativa de transcrever. Essa inversão, por assim dizer, deve ser um tipo marco também. 
       Se em Dádiva, por exemplo, eu tentava emular palavras que você poderia ter dito, como o espírito se tivesse separado do corpo por uma vontade forte o bastante para ir buscá-las, ikiryou, aqui, as palavras e verdades são tuas e eu, só cantei este derradeiro jardim, por você ter dito que esqueceu como se faz. Um amém para Chris Martin, que disse que velhos amigos não tem fim.

Beleza Parasita (2019)
Letra: Fabíola Passos Almeida

Música: Thales Salgado

Aprofundar raízes
Imobilidade
Mergulhar no solo
Responsabilidade
Confundir-se com a terra
Indiferenciar

Buscar seiva
Alimentação
Acompanhar a paisagem
Contemplação
Atravessar estações
Colheita

Permanecer no jardim
Monotonia
Abraçar um tronco
Beleza parasita



quarta-feira, 8 de abril de 2020

O Início do Fim

"Strindberg também ilustra o poder consolador da arte. A única coisa que durante longos períodos de sua vida lhe poderia dar algum tipo de calma, e mesmo uma espécie de felicidade, era o seu poder de criar. Então, começou a registrar o que lhe acontecia. E, de fato, esse escape imaginativo, ele bem poderia ter terminado em uma casa de loucos." - 
Frank Laurence Lucas, The Drama of Ibsen and Strindberg

Títulos das composições ainda em aberto no blog.

            Por pouco a frase para início deste post não foi "tudo o que tem um início, tem um fim Neo" (de todo modo, agora que está no texto, ela acabou entrando, não?). 
             O hiato de publicações no blog durou um ano e dezoito dias. Durante esse período, foquei em textos no Instagram (@fmodestia): Infiltrados na Klan, Vingadores Ultimato, Cemitério Maldito, Pokémon - Detetive Pikachu, Rocketman, a 5ª Temporada de Black Mirror, X-Men Fênix Negra, Homens de Preto Internacional, o remake de O Rei Leão, o Saint Seiya da Netflix, Sua Alegria Foi Cancelada da Fresno, Velozes e Furiosos apresenta Hobbs & Shaw... O Respiro da Scalene, a Pausa do 5 a Seco! Era uma vez em Hollywood, Bacurau, Yesterday, Who Are You Know de Madison Cunningham, a peça Sísifo, A Música da Minha Vida, O Farol, Uma Segunda Chance para Amar, Não Vejo a Hora de Humberto Gessinger, Star Wars IX - A Ascensão Skywalker, To Be One With You de Pluralone (o primeiro álbum de Josh Klinghoffer). Com um limite de caracteres menor, é preciso ser mais conciso, venho até cogitando retrabalhar algum desses textos de 2019 aqui. 
            Então, depois de aquecer em exercícios escrevendo cem palavras por dia (seja qual fosse o tema) dei preferência por acontecimentos atuais. Pautas quentes, por assim dizer. Se estive no show do Los Hermanos, a estreia da turnê da Fresno em Santos (e minha recente obsessão pelas composições de Lucas Silveira). Postar um desenho no Insta e não escrever nada parece mais aceitável que fazê-lo no blog, então, eles passaram a surgir menos esporádicos. O tempo livre para o desenho é o mesmo para a escrita, então, não é exatamente uma escolha. A questão, enfim, não é essa.
          Em maio de 2007, o produtor Carlton Cuse comentou: "Eu acho que para shows baseados na história como Lost, opostamente a shows baseados em franquias, como E.R. ou CSI, a audiência quer saber quando a história acabará. Quando J.K. Rowling anunciou que haveriam sete Harry Potter, deu aos leitores um senso claro de qual seria exatamente o seu investimento. Queremos que nossa audiência possa saber o mesmo." 
          O objetivo desse blog era simples: haviam 125 canções compostas entre 2007 e 2013. Ao contar os acontecimentos por trás de cada composição não seria 'necessário' escrever mais nada. Sem perceber, outras composições vieram:2016, 2017, 2018, 2019. Algumas ainda nem foram gravadas, como C.P.T.M. A imagem que ilustra o post vem para dizer que, de alguma forma, o fim está próximo. Acho que, sem explicação, vem os últimos dias, quando acaba é apenas um começo.