quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Efeito Borboleta

Caos: Quando o presente determina o futuro, mas o presente aproximado não determina aproximadamente o futuro. - Edward Lorenz



Por Jorge Luís Barros

         "Quando a previsão do futuro se tornou tarefa ingrata, colocou os olhos no passado. Estava certo, ainda possuísse nada além da intuição como pilar, de que esse comportamento o levaria a encontrar a saída para a situação em que se encontrava. Repleto de silêncios, sem nenhuma palavra, som ou o que o valha. Havia, no entanto, uma série de "quês". Um maldito queísmo alastrado em sua fala havia anos; mesmo quando essa fala era nada mais que o fiapo de um pensar. Abriu então a empoeirada mochila vermelha, uma série de cadernos, utilizados por cerca de três anos antes de se transfigurarem em referências para consultas. Tateava cada uma das páginas tentando alcançar a desesperada destreza de Evan Treborn, sem sucesso. Lia e relia o pequeno trecho escrito no verso de um recibo da agência em que trabalhou:

A ponte entre sua mente e aquele instante não fora realizada. Estava ainda sentado no edredom escorregadio. Equações nunca estiveram entre suas áreas de atuação proeminente, então afirmava: cálculos em física quântica estariam fora de cogitação. Desaprendia cada vez mais em matéria de pêndulos duplos. Creia nisto: Quando na quarta série, sua professora de matemática - depois de observar cerca de noventa e sete por cento dos alunos deixar a sala ao fim de uma prova - solicitou a mais formosa de suas colegas que o ajudasse a resolver alguns cálculos envolvendo porcentagem. Porcentagem, imagine você! Era óbvio: a instabilidade nas equações não lineares certamente seriam uma impossibilidade prática. De onde tirara o caos, então? Provavelmente do palhaço do crime. Vestido de púrpura ele se apresentava como um agente. A palavra seguia tatuada com faca em suas sinapses. Era, com alguma sombra de dúvida, triste. Entre suas intenções estava tirar os sentimentos mais doces de pedestais, a vontade de estar acima de tudo que fosse patético, como o querer escravo que recrudescia de uma semente no solo constituído de massa cinzenta. Se dizia que o sorriso de alguém era capaz de trazer o dele, como alcançara esse estágio de bem-querer genuíno?  Poderia ser apenas a história dolorosa de possibilidades irrealizadas. O Presque vu ocorria com frequência maior que a de seu irmão mais conhecido; Por Zeus! Como é que se diz mesmo? Melhor passarmos ao próximo parágrafo que desse nada se salva!"

         O convite para falar de Efeito Borboleta veio como uma surpresa, Thales me chamou dizendo que nem sempre sabia como falar de suas letras, então tentei criar uma narrativa que remetesse a esse desconhecimento, aqueles instantes em que você sente a lembrança na ponta da língua mas não consegue traduzir sabe? o tal "presque vu" do parágrafo passado. Longe da ideia megalomaníaca do bater de asas de uma borboleta causar um tornado no Texas, meu pensamento era: quais são as pequenas ações ou encontros que pavimentam o futuro. O post da canção Volta é um exemplo disso, indo um pouco além, o próprio blog só existe por ter havido na "grande história", sete anos dedicados as composições que surgem nos textos. Tomei a liberdade de entrar em contato com pessoas próximas a ele para intuir o que achavam da música oito anos depois de sua criação. Tiele Rodrigues foi sucinta "o texto continua belo". Bruno Oliveira, baixista e coautor de canções como Felinos e Cantillena Sant'Anna, afirmou que há boas frases como "a lua cheia já prometeu que me fará companhia", e sentia o fantasma de Lobão por toda a melodia. Ambos concordaram que o verso final é o mais bonito da música. Procurei também pelo cantor Fabio Kulakauskas autor de, entre outras, Por mais que te desejo e Noites esfrias, no entanto, em virtude do intenso estudo de Estatística não consegui sua declaração;
Tive a oportunidade de perguntar a Thales acerca de onde ele surgiu com alguns dos versos. A descrição da Joaninha veio da canção de mesmo nome do alagoano Djavan, o disco Matizes fora sua entrada real no universo do artista. Já a ideia da ópera surgiu do capítulo IX do Dom Casmurro de Machado de Assis, mas apenas por alto. O filósofo francês Michel de Montaigne já registrara: "todo resumo de um bom livro é um resumo tolo", a ideia não era tentar sintetizar, era aquela ideia que parece boa demais e se pode atribuir novos significados. Ele concordou quanto a Lobão "à época eu estava ouvindo muito o acústico MTV dele, toda a questão de ir da delicadeza ao peso era impressionante, fora o número de instrumentos. O Lobão tem aquela coisa de fazer vocalizações, como em Pra onde você vai? e até então era um recurso que eu nunca tinha tentado utilizar, por vergonha mesmo, você nota que mantenho bem leve, era uma tentativa de ir para um caminho levemente distinto do que a Falsa Modéstia tinha feito até então, ou não? nesse voz e violão tentei cantar de forma mais natural, sem imitar tanto." Ele conseguiu encontrar o manuscrito que usara para registrar anos antes na casa de sua avó e reproduzo aqui, no fim das contas não houve tantas alterações. Até esse momento, ele não estava a se preocupar tanto com questões de autorreferência ou de exclusividade de termos, então essa canção marca um período de menor preocupação com o resultado final, como seria evidente a partir do momento em que ele conhecesse A Estética do Frio de Vitor Ramil. 


Efeito Borboleta (2008)

Se eu olho para o céu
E vejo as nuvens indo para um só lado
Eu sei que é o seu
Se está escuro
Sei que as estrelas podem me guiar
A lua cheia já prometeu
Que me fará companhia
Há musica no ar, música no ar
música no ar

Tudo me leva ao seu encontro
Eu simplesmente deixei-me levar
O teu sorriso em algum lugar
Traz também o meu
E mesmo quando o poema
Chega ao derradeiro fim
O caos é a saudade de você

As asas multicoloridas da Joaninha
Refletem pela mata, o brilho dos vaga-lumes
A Terra é um palco onde uma opera é regida
Pelos deuses e por ti

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